quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Sentença

Passando aquele portão, não há vida.

Não há contas a pagar, trânsito, novela, aquecimento global, iphone, facebook, almoço de domingo, rotina. Não há volta pra casa.
Enquanto o relógio corre aqui fora, lá dentro só linha reta infinita. Paredes largas, eco, corredores, vozes ferozes, aberturas sem janelas.

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Não é uma prisão qualquer. Na Penitenciária de Segurança Máxima não há celas cheias nem distrações. Há uma pessoa cercada por paredes brancas, uma pequena abertura por onde entram comida e vozes, um buraco para o calor e o frio.

E uma estrutura gigantesca e cara mantida pelo Estado para garantir que aqueles lá fiquem longe da vida aqui.

Depois de passar por dezenas de processos de segurança para adentrar a penitenciária, acabei me distraindo da ideia de que era uma prisão, um lugar de criminosos, de sofrimento. Até que me deparei com aquele corredor escuro.

Antes de ir, pensei que pudesse sentir medo, talvez repulsa. Mas vi pela janela estreita da cela um olhar de dor, uma solidão pesada e fria como as portas de ferro.

O que senti foi uma profunda compaixão.

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Quase todos os detentos lá são acusados de crimes graves, muitos traficantes, assassinos. Não duvido que todos (ou quase todos) mereçam estar lá. Devem, sim, cumprir suas penas até o fim.

Mas não deixa de ser triste ver uma vida condenada a 30 anos “de nada”.
Criamos masmorras para isolar pessoas capazes das maiores atrocidades.

A essas pessoas foi imposta a pior pena que se pode receber, mesmo em uma prisão que leva em conta os direitos humanos:

A sentença de ficarem sozinhas, sem distrações e companhias, com todo o tempo do mundo para pensar em tudo o que foi e no que não pode mais ser. Isoladas de tudo e todos, com breves momentos de contato com poucos familiares. Tendo que exercer a obediência absoluta, a total falta de privacidade.
Nenhuma liberdade.

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Visitei essa prisão para uma matéria sobre um projeto que foi implantado lá, cujo objetivo é incentivar a leitura entre os presos. Eles ganham o direito de reduzir alguns dias de suas penas conforme as obras que leem e as resenhas produzidas.

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Um comentário:

  1. Que pesado!!
    Mas o texto é de uma sensibilidade ímpar. Tocante.

    Adorei, Tati!

    Beijo, Karen alt

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