sábado, 3 de março de 2012

Amor e dor – Da série “Mães"


Devia estar feliz. 

Afinal, mães são perfeitas. Semideusas misteriosas, que compartilham com a natureza o dom de gerar a vida.

Mas, enquanto o bebê chorava, permanecia sentada na cozinha, implorando ao marido pelo telefone que voltasse. Não podia pegá-lo do berço, não conseguia.

Ele era loiro, de olhos claros, sorria o sorriso sem dentes mais lindo que podia existir. Quis tanto aquele menino que, nos dias férteis, após a transa, corria para o banheiro disfarçada, pulava na banheira vazia e jogava as pernas para cima. Tinham lhe dito que nessa posição o espermatozóide chegava mais depressa ao óvulo faminto. Mas jamais admitiria fazer o truque na frente do marido.

 A mãozinha, ou melhor, o truque das pernas, funcionou. Ou seja lá o que quer que tenha feito aquele projeto de gente chegar ao seu destino para se tornar um filho.

O filho festejado pelo marido, pela família. O filho cujo rosto sonhou conhecer durante todos aqueles meses de espera.

Como podia sofrer tanto agora e amar com tanta força ao mesmo tempo?

Estava longe de casa, da família, dos amigos. Via-se como numa cena alheia, mais magra, esvaindo-se em  leite e lágrimas, encolhida.

Às vezes passava, aliviava-se em poder amar sem dor. Mas o medo voltava e o marido corria do trabalho para casa para socorrê-la.

Depressão pós-parto.

Claro que já tinha ouvido falar, talvez até tenha lido em alguma revista feminina a respeito. Mas a palavra       ‘depressão’parecia tão limitada diante desses momentos repletos de culpa, ansiedade, medo e amor...

****

Minha amiga terminou seu relato sobre sua difícil experiência desabafando: “eu nunca vi nenhuma mãe falar como é difícil. Estão todas sempre falando de como seus bebês são fofinhos, e tudo é lindo,  maravilhoso”. Creio que muitas não têm coragem de compartilhar o que consideram fracassos pessoais; melhor seguir o roteiro das mães felizes na frente das outras mães. E tem a culpa, quando nem pra nós mesmas queremos admitir o que sentimos.

Eu não sou mãe para saber, mas admiro a coragem dessa mulher na qual se transformou minha amiga de infância, que assume a sua dor e não esconde o que passou só porque agora, felizmente, tudo está bem.

Ela é uma de tantas mulheres incríveis, mães, que têm me confiado suas experiências. Não sei a razão de abrirem seu coração justo para mim, mas talvez  seja simples: porque não sou mãe, não vou julgá-las na obrigação de parecerem felizes. Tampouco sou suas próprias mães, que talvez dirão que tudo é besteira, que criaram 4 filhos sozinhas, sem empregada, e foi simples assim.

E, pelo que tenho ouvido, não é fácil mesmo. Parir um filho é fazer nascer uma nova mulher, um novo casal, sem se perder de si mesma.

Mas minha amiga não se perdeu. Se tratou, contou com o amor da família, de seu homem ( que também deve ter passado por momentos difíceis para segurar essa barra!) e ressurgiu mais dona de si do que nunca, linda, madura e, acima de tudo, a mãe que sempre sonhou ser.



Um comentário:

  1. Esse é o textio mais lindo que já li!!!
    Não sei se é porque fala de mim, mas achei fantástico.
    Parabens amiga, estou muito emocionada para continuar escrevendo!
    Obrigada!

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